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sexta-feira, 30 de julho de 2010

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RUMI disse... Poetisa Cora Coralina.. 
.Bebo com prazer da tua água, feito poesia, onde transito nas suas lendas feito canção!
Visito os becos do teu Goiás, como se visitasse tua alma poética que derrama poesia em tudo que fez... Teu poemas, não é nada mais do que uma ferramenta para o mundo. Nas tuas mãos Cora querida, essa ferramenta é sempre usada de forma delicada, tão presente no DNA dos teus versos, que respeita a beleza insuspeitada do mundo! Tua poesia acaba por me impor seu fascínio, me ajudando a alicerçar o pensamento sobre coisas tão simples e tão belas, que sustentam o teu reinado nas letras
poéticas no Brasil!
Queria poder eu, te dizer o que aqui escrevo...
Como não posso... Deixo em tua memória o meu beijo e a minha paixão!
Poeta - Osmar P. de Vasconcelos

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Cora Coralina que todos conhecemos: aquela mulher que se descobriu poeta já bem velhinha, depois de uma vida de luta, inclusive com um casamento desastroso que ela carregou corajosamente e, só após a morte do marido, conseguiu se ver em sua enorme e verdadeira dimensão, como mulher e como poeta.


Aventureira e libertária A Ana que virou Cora e foi rejeitada pela cidade, criou asas e ganhou fama.

  Voz viva da cidade de Goiás, personagem e símbolo da tradição da vida interiorana, Cora Coralina nasceu em 20 de agosto de 1889, na casa que pertencia à sua família há cerca de um século e que se tornaria o museu que hoje reconta sua história. Filha do Desembargador Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto e Jacita Luiza do Couto Brandão, Cora, ou Ana Lins dos Guimarães Peixoto (seu nome de batismo), cursou apenas as primeiras letras com mestra Silvina e já aos 14 anos escreveu seus primeiros contos e poemas. Tragédia na Roça foi seu primeiro conto publicado.

Em 1934 casou-se com o advogado Cantídio Tolentino Bretas e foi morar em Jabuticabal, interior de São Paulo, onde nasceram e foram criados seus seis filhos. Só voltou a viver em Goiás em 1956, mais de vinte anos depois de ficar viúva e já produzindo sua obra definitiva. O reencontro de Cora com a cidade e as histórias de sua formação alavancou seu espírito criativo. 
 Tradições e festas religiosas, a comida típica da região, as famílias e seus 'causos', tudo motivava a escritora fazer uma ponte entre o passado e presente da cidade, numa tentativa de registrar sua história e entender as mudanças. Nas suas próprias palavras: "rever, escrever e assinar os autos do Passado antes que o Tempo passe tudo ao raso". Com a mesma rica simplicidade de seus personagens, Cora fazia doces cristalizados para vender.  Seu primeiro livro, Poemas dos Becos de Goiás e outras histórias mais , foi publicado em 1965, e levou Cora, aos 75 anos, finalmente a ser reconhecida como a grande porta-voz de uma realidade interiorana já afetada pelo avanço da modernidade. O poeta Carlos Drummond de Andrade, surpreendido com a obra de Cora, escreveu-lhe em 1979: "(...) Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu livro é um encanto, seu lirismo tem a força e a delicadezadas coisas naturais (...)".




Cora Coralina faleceu em Goiânia a 10 de abril de 1985. Logo após sua morte, seus amigos e parentes uniram-se para criar a Casa de Coralina, que mantém um museu com objetos da escritora.
- Doutor Honoris Causa - Universidade Federal de Goiás (1983)
- Troféu Juca Pato - União Brasileira dos Escritores (1983)
- Troféu Cora Coralina - Coordenadoria de Moral e Civismo da Secretaria de Educação do Rio de Janeiro (1982)
- Grande Prêmio da Crítica - Associação Paulista de Críticos de Arte




"Versos... não Poesia... não um modo diferente de contar velhas histórias"

Mascarados

Saiu o Semeador a semear
Semeou o dia todo
e a noite o apanhou ainda
com as mãos cheias de sementes.
Ele semeava tranqüilo
sem pensar na colheita
porque muito tinha colhido
do que outros semearam.
Jovem, seja você esse semeador
Semeia com otimismo
Semeia com idealismo
as sementes vivas
da Paz e da Justiça.

Cora Coralina
MEU EPITÁFIO

Morta...serei árvore
Serei tronco, serei fronde
E minhas raízes
Enlaçadas às pedras de meu berço
são as cordas que brotam de uma lira.

Enfeitei de folhas verdes
A pedra de meu túmulo
num simbolismo
de vida vegetal.

Não morre aquele
que deixou na terra
a melodia de seu cântico
na música de seus versos
.
MULHER DA VIDA

Mulher da Vida,
Minha irmã.
De todos os tempos.
De todos os povos.
De todas as latitudes.
Ela vem do fundo imemorial das idades
e carrega a carga pesada
dos mais torpes sinônimos,
apelidos e ápodos:
Mulher da zona,
Mulher da rua,
Mulher perdida,
Mulher à toa.
Mulher da vida,
Minha irmã.’ 
Cora Coralina
Considerações de Aninha

Melhor do que a criatura,
fez o criador a criação.
A criatura é limitada.
O tempo, o espaço,
normas e costumes.
Erros e acertos.
A criação é ilimitada.
Excede o tempo e o meio.
Projeta-se no Cosmos

Cora Coralina
Assim eu vejo a vida

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

Cora Coralina

CORA CORALINA, QUEM É VOCÊ?


















Sou mulher como outra qualquer.
Venho do século passado
e trago comigo todas as idades.

Nasci numa rebaixa de serra
Entre serras e morros.
“Longe de todos os lugares”.
Numa cidade de onde levaram
o ouro e deixaram as pedras.

Junto a estas decorreram
a minha infância e adolescência.

Aos meus anseios respondiam
as escarpas agrestes.
E eu fechada dentro
da imensa serrania
que se azulava na distância
longínqua.

Numa ânsia de vida eu abria
O vôo nas asas impossíveis
do sonho. 

Venho do século passado.
Pertenço a uma geração
ponte, entre a libertação
dos escravos e o trabalhador livre.
Entre a monarquia caída e a república
que se instalava.

Todo o ranço do passado era presente.
A brutalidade, a incompreensão, a ignorância, o carrancismo.
Os castigos corporais.
Nas casas. Nas escolas.
Nos quartéis e nas roças.
A criança não tinha vez,
Os adultos eram sádicos
aplicavam castigos humilhantes.

Tive uma velha mestra que já
havia ensinado uma geração
antes da minha.
Os métodos de ensino eram
antiquados e aprendi as letras
em livros superados de que
ninguém mais fala.

Nunca os algarismos me
entraram no entendimento.
De certo pela pobreza que marcaria
Para sempre minha vida.
Precisei pouco dos números.

Sendo eu mais doméstica do
que intelectual,
não escrevo jamais de forma
consciente e racionada, e sim
impelida por um impulso incontrolável.
Sendo assim, tenho a
consciência de ser autêntica. 
Nasci para escrever, mas, o meio,
o tempo, as criaturas e fatores
outros, contra-marcaram minha vida.

Sou mais doceira e cozinheira
Do que escritora, sendo a culinária
a mais nobre de todas as Artes:
objetiva, concreta, jamais abstrata
a que está ligada à vida e
à saúde humana.

Nunca recebi estímulos familiares para ser literata.
Sempre houve na família, senão uma
hostilidade, pelo menos uma reserva determinada
a essa minha tendência inata.
Talvez, por tudo isso e muito mais,
sinta dentro de mim, no fundo dos meus
reservatórios secretos, um vago desejo de analfabetismo.
Sobrevivi, me recompondo aos
bocados, à dura compreensão dos
rígidos preconceitos do passado.

Preconceitos de classe.
Preconceitos de cor e de família.
Preconceitos econômicos.
Férreos preconceitos sociais. 

A escola da vida me suplementou
as deficiências da escola primária
que outras o destino não me deu.

Foi assim que cheguei a este livro
Sem referências a mencionar.

Nenhum primeiro prêmio.
Nenhum segundo lugar.

Nem Menção Honrosa.
Nenhuma Láurea.

Apenas a autenticidade da minha
poesia arrancada aos pedaços
do fundo da minha sensibilidade,
e este anseio:
procuro superar todos os dias
Minha própria personalidade
renovada,
despedaçando dentro de mim
tudo que é velho e morto.

Luta, a palavra vibrante
que levanta os fracos
e determina os fortes.

Quem sentirá a Vida
destas páginas...
Gerações que hão de vir
de gerações que vão nascer.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

SIMPLESMENTE, Hilda de Ricardo Picchi


Homenagem singular e poética 
sobre Hilda Hilst, 
uma das escritoras 
mais importantes da literatura Brasileira



Minha tara é a linguagem."Hilda Hilst"

Hilda Hilst – O Espírito da Coisa


Alcoólicas (Trecho de, Hilda Hilst)


Se um dia te afastares de mim, Vida — o que não creio. Porque algumas intensidades têm a parecença da bebida — Bebe por mim paixão e turbulência, caminha Onde houver uvas e papoulas negras (inventa-as) Recorda-me, Vida: passeia meu casaco, deita-te. Com aquele que sem mim há de sentir um prolongado vazio. Empresta-lhe meu coturno e meu casaco rosso: compreenderá. O porquê de buscar conhecimento na embriaguês da via manifesta. Pervaga. Deita-te comigo. Apreende a experiência lésbica: O êxtase de te deitares contigo. Beba. Estilhaça a tua própria medida.

Hilda Hilst a escritora multimídia que escandalizou a sociedade com seus atos libertários e que se dedicava ao mundo do além túmulo.



"Aflição de ser eu e não ser outra.
Aflição de não ser, amor, aquela

Que muitas filhas te deu, casou donzela
E à noite se prepara e se adivinha
Objeto de amor, atenta e bela.

Aflição de não ser a grande ilha
Que te retém e não te desespera.
(A noite como fera se avizinha)
Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel
Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra."
Hilda Hilst

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Fotografias Bettina Rheims - Poesia Hilda Hilst

Hilda Hilst - da morte. odes mínimas










"Quem coloca fervor e paixão na linguagem, sempre será uma tarada.

A escritora nasceu em Jaú, no interior paulista, em 21 de abril de 1930, e morava há 40 anos em Campinas na chácara Casa do Sol, com a escolta de dezenas de cachorros e gatos.

Mais do que ir ao fim do mundo, Hilda Hilst foi ao fundo de si mesma e não se esgotou. Em Estar sendo, ter sido (Nankim, 1997), encerra a obra com um verso lancinante: "Essa sou eu.// Poeta e mula". Com lealdade e coerência, carregou sozinha sua loucura orquestrada, sua fome pelo absoluto no mínimo, sua curiosidade erótica. Hilda Hilst amava Hilda Hilst enquanto Hilda Hilst odiava Hilda Hilst. Ria pastoso do destino que a fez buscar o desejo sem recompensa. Tantas foram que seu temperamento ainda não acabou de dizer o que queria. "Não há silêncio bastante para o meu silêncio."

Em Hilda Hilst, o amor não se opera, nem pode ser extraído ou reaproveitado em transplante de órgão. Nas décadas de 60 e 70, esteve ao lado da crítica. Anatol Rosenfeld, no prefácio de Fluxofloema, a escalou no seleto grupo capaz de realizar três gêneros com volúpia: os versos, a dramaturgia e a ficção. Em Poesia (1957-1967), falava da dificuldade de verbalizar o amor, talvez porque o mesmo suspiro que inicialmente comove já seja o estertor da paixão. O ápice é o fim. Enquanto a maioria da geração de 60 engajava-se no combate à ditadura militar, a prosa de Hilda era livre, ou quase isso, uma "prisão libertadora", como afirmava Antonio Carlos Villaça. "Pássaro-palavra, livre, volúpia de ser asa na minha boca."

Seus versos terminariam empalhados nas antologias, caracterizados como sérios, rilkeanos e incompreendidos pelo público. "Chamaram minha obra de palimpsesto. Depois disso, quem iria me procurar?", ela me confessou.

Tudo mudou na década de 90. Hilda ficou cansada da prosa certinha. Decidiu fazer sátira para rir. Lançou a antologia erótica O Caderno Rosa de Lory Lamby, Contos de Escárnio e Cartas de um sedutor. A prosa circense não deu certo. Nem leitores, muito menos críticos gargalharam. Antes "senhora das alvoradas", ficou conhecida como "obscena senhora H". Trocaram apenas os rótulos.

A escritora derrubou as fronteiras entre o bem e o mal, entre o certo e o errado. A casualidade mecânica do sexo é convertida em catarse alucinada. Pulsação e metamorfose. A protagonista Hilé, de A obscena senhora D, quer ser um grande animal. "Ando galopando desde sempre búfalo, zebu, girafa e me afundo nos capins resfolegando." A carne exala inquietação mística, antropofágica. Não só comer outro corpo, mas também mastigar o mundo, mastigar Deus. "Engolia o corpo de Deus a cada mês, não como quem engole ervilhas ou roscas ou sabres, engolia o corpo de Deus como quem engole o Mais. Por não acreditar na finitude me perdia no absoluto infinito." Fez a fusão do erotismo com a religião, da eucaristia com o sexo, do altar com a cama. A Senhora D é uma mulher no encalço de sua imagem e que sente prazer em não encontrá-la. "Engasgo neste abismo, cresci procurando." É a ânsia da pureza na degradação.

Hilda desarma a realeza do homem, que mais preocupado com o seu desejo, o desejo do outro acaba atrapalhando o seu gozo. Ferina e insurrecta, compartilha a filosofia da alcova com o Marquês de Sade. "Todo o homem de pau duro almeja ser déspota." O sexo é exercício positivo contra a opressão particular. As histórias entretêm e, ao mesmo tempo, mantêm uma peleja característica do embate socrático. Perguntar em Hilda Hilst é se aniquilar. Em sua constelação sem favores e chantagens, fazer-se homem é ainda ser mulher. A perversão nunca perde a inocência fundadora. Em O caderno rosa de Lory Lamb, uma criança rouba os originais do pai e copia em seu diário passagens pornográficas, sem entender absolutamente nada. Hilda realiza o sonho do cineasta Buñuel, que queria colocar uma criança de branco declamando textos pornográficos como cantigas de roda. A poeta não hierarquizava a vida. Seu exorcismo era um milagre que servia aos outros, nunca em seu benefício.