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quinta-feira, 19 de maio de 2011

Pensamentos, Citações, Reflexões, Frases por Isabel Allende





Isabel Allende 

é uma escritora chilena que vale a pena conhecer...

...desde A Casa dos Espíritos em 1982, que me despertou a sua escrita! Mas foi com o seu testemunho no livro Paula, onde nos conta a longa caminhada da sua vida até à morte da sua filha, como um acontecimento duro mas ao mesmo tempo natural de uma forma incrivelmente humana.
A Soma Dos Dias é o seu último livro que espero que me faça "crescer" mais um bocadinho como ser humano!

Biografia Isabel Allende


Isabel Allende Llona (Lima2 de Agosto de 1942) é uma jornalista e escritora chilena. Apesar de ter nascido em Lima, sua família logo voltou para o Chile, sua terra natal. Atualmente está radicada nos Estados Unidos da América.
É filha de Tomás Allende, funcionário diplomático e primo irmão de Salvador Allende, e de Francisca Llona.
Isabel é considerada uma das principais revelações da literatura latino-americana da década de 1980. Sua obra é marcada pela ditadura no Chile, implantada com o golpe militar que em 1973 derrubou o governo do primo de seu pai, o presidente Salvador Allende (1908-1973).
Escreveu A casa dos espíritos (1982) e ganhou reconhecimento de público e crítica. A obra foi filmada em 1993 por Bille August, com Jeremy Irons e Meryl Streep. Em 1995 lançou o livro Paula, que a autora escreveu para a sua filha que estava em coma devido a um ataque de porfiria. Como a autora não sabia se a sua memória voltaria após a saída do coma, Isabel Allende resolveu contar a sua história para auxiliar a filha a lembrar dos fatos. Paula passou a ser então um retrato auto-biográfico. Sua filha não voltou do coma e morreu um tempo depois.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Al Berto - Prefácio para um livro de poemas

Conheci 

um homem que possuía uma cabeça de vidro.Víamos 
-pelo lado menos sombrio do pensamento- todo o sistema 
planetário.Víamos o tremelicar da luz nas veias e o lodo das 
emoções na ponta dos dedos.O latejar do tempo na humidade 
dos lábios.E a insónia ,com seus anéis de luas 
quebradas e espermas ressequidos.As estrelas mortas das 
cidades imaginadas.Os ossos (tristes) das 
palavras.A noite cerca a mão inteligente do homem que possui 
uma cabeça transparente.Em redor dele 
chove.Podemos adivinhar um chuva 
espessa,negra,plúmbea.Depois, o homem abre a mão, uma laranja 
surge,esvoaça.As cidades(como em todos os livros que li) 
ardem.Incêndios que destroem o último coração do sonho.Mas 
aquele que se veste com a pele porosa da sua própria 
escrita olha,absorto,a laranja.A queda da laranja 
provocará o poema?A laranja voadora é ,ou não é,uma 
laranja imaginada por um louco?E um louco,saberá o 
que é uma laranja?E se a laranja cair?E o poema? 
E o poema com uma laranja a cair?E o poema em 
forma de laranja?E se eu comer a laranja,estarei a 
devorar o poema?A ficar louco?(...)E a palavra 
laranja existirá sem a laranja?E a laranja voará sem 
a palavra laranja?E se a laranja se iluminar a 
partir do seu centro, do seu gomo mais secreto,e alguém 
a (esquecer) no meio da noite-servirá(o brilho)da 
laranja para iluminar as cidades há muito mortas?E se 
a laranja se deslocar no espaço-mais depressa que o 
pensamento, e muito mais devagar que a laranja escrita-criará 
uma ordem ou um caos?O homem que possui uma 
cabeça de vidro habita o lado de fora das muralhas da 
cidade.Foi escorraçado.(E)na desolação das terras,noite 
dentro,vigia os seus próprios sonhos e pesadelos.Os seus 
próprios gestos-e um rosto suspenso na 
solidão.Onde mora o homem que ousou escrever com a unha na sua 
alma,no seu sexo,no seu coração?E se escreveu laranja 
na alma,a alma ficará saborosa?E se escreveu 
laranja no coração,a paixão impedi-lo-á de morrer?E 
se escreveu laranja no sexo, o desejo 
aumentará?Onde está a vida do homem que escreve, a vida da 
laranja,a vida do poema-a Vida,sem mais nada-estará 
aqui?Fora das muralhas da cidade?No interior do meu 
corpo? ou muito longe de mim-onde sei que possuo uma 
outra razão...e me suicido na tentativa de me 
transformar em poema e poder,enfim,circular 

Há-de flutuar uma cidade

há-de flutuar uma cidade no crepúscolo da vida 
pensava eu... como seriam felizes as mulheres 
à beira mar debruçadas para a luz caiada 
remendando o pano das velas espiando o mar 
e a longitude do amor embarcado 

por vezes 
uma gaivota pousava nas águas 
outras era o sol que cegava 
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite 
os dias lentíssimos... sem ninguém 

e nunca me disseram o nome daquele oceano 
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas 
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua 
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar 
se espantasse com a minha solidão 

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.) 

um dia houve 
que nunca mais avistei cidades crepusculares 
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta 
inclino-me de novo para o pano deste século 
recomeço a bordar ou a dormir 
tanto faz 
sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade

Eremitério

mais nada se move em cima do papel 

nenhum olho de tinta iridescente pressagia 

o destino deste corpo 

os dedos cintilam no húmus da terra 

e eu 

indiferente à sonolência da língua 

ouço o eco do amor há muito soterrado 

encosto a cabeça na luz e tudo esqueço 

no interior dessa ânfora alucinada 

desço com a lentidão ruiva das feras 

ao nervo onde a boca procura o sul 

e os lugares dantes povoados 

ah meu amigo 

demoraste tanto a voltar dessa viagem 

o mar subiu ao degrau das manhãs idosas 

inundou o corpo quebrado pela serena desilusão 

assim me habituei a morrer sem ti 

com uma esferográfica cravada no coração 

Dizem que a paixão o conheceu

dizem que a paixão o conheceu 
mas hoje vive escondido nuns óculos escuros 
senta-se no estremecer da noite enumera 
o que lhe sobejou do adolescente rosto 
turvo pela ligeira náusea da velhice 

conhece a solidão de quem permanece acordado 
quase sempre estendido ao lado do sono 
pressente o suave esvoaçar da idade 
ergue-se para o espelho 
que lhe devolve um sorriso tamanho do medo 

dizem que vive na transparência do sonho 
à beira-mar envelheceu vagarosamente 
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria 
nenhum ofício cantante 
o tenha convencido a permanecer entre os vivos

Trabalhos do Olhar

Escrevo-te a 
sentir tudo isto...e num instante de maior lucidez 
poderia ser o rioas cabras escondendo o delicado 
tilintar dos guizosnos sais de prata da 
fotografiapoderia erguer-me como o castanheiro dos 
contossussurrados junto ao fogoe deambular trémulo com as 
avesou acompanhar a sulfurica borboleta 
revelando-sena saliva dos lábiospoderia imitar aquele 
pastorou confundir-me com o sonho de cidadeque a 
poucoe pouco morde a sua 
imobilidade........habito neste país de água por enganosão-me 
necessárias imagens , radiografias de ossosrostos 
desfocadosmãos sobre corpos impressos no papel e nos 
espelhosrepara.....nada mais possuoa não ser este recado que hoje 
segue manchadode finos bagos de 
romãrepara....como o coração de papel amareleceu no 
esquecimentode te amar..... 

Postscriptum



... apercebo o lume dum coração antigo e simples 
atravesso a cor luminosa dos sonhos sem me deter... 
... aqui deixo o espólio daquele cuja vida 
é cintilação de lugares nítidos... 

(um pouco de café, uma carta, um pedaço de vidro) 

... tenho a certeza de que se virasse o corpo do avesso 
ficaria tudo por recomeçar... 
... mas se aqui voltares 
talvez encontres estes papéis escritos 
no recanto mais esquecido da noite... talvez 
descubras o vazio onde o corpo desgasto esperou... 

... vou destruir todas as imagens onde me reconheço 
e passar o resto da vida assobiando ao medo... 
Poeta português, natural de Sines. Al Berto frequentou diversos cursos de artes plásticas, em Portugal e em Bruxelas, onde se exilou em 1967. A partir de 1971 dedicou-se exclusivamente à literatura. Estreou-se com o título À Procura do Vento no Jardim de Agosto (1977). A sua poesia retomou, de algum modo, a herança surrealista, fundindo o real e o imaginário. Está presente, frequentemente, uma particular atenção ao quotidiano como lugar de objectos e de pessoas, de passagem e de permanência, de ligação entre um tempo histórico e um tempo individual. Por vezes, os seus textos apresentam um carácter fragmentário, numa ambiguidade entre a poesia e a prosa (Lunário, 1988; e O Anjo Mudo, 1993).
A sua obra poética engloba Trabalhos do Olhar (1982), Salsugem (1984), O Medo/Trabalho Poético, 1976-1986 (prémio de poesia de 1987 do Pen Club), O Livro dos Regressos (1989), A Secreta Vida das Imagens (1991), Luminoso Afogado (1995) e Horto de Incêndio (1997).