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segunda-feira, 9 de maio de 2011

Al Berto - Prefácio para um livro de poemas

Conheci 

um homem que possuía uma cabeça de vidro.Víamos 
-pelo lado menos sombrio do pensamento- todo o sistema 
planetário.Víamos o tremelicar da luz nas veias e o lodo das 
emoções na ponta dos dedos.O latejar do tempo na humidade 
dos lábios.E a insónia ,com seus anéis de luas 
quebradas e espermas ressequidos.As estrelas mortas das 
cidades imaginadas.Os ossos (tristes) das 
palavras.A noite cerca a mão inteligente do homem que possui 
uma cabeça transparente.Em redor dele 
chove.Podemos adivinhar um chuva 
espessa,negra,plúmbea.Depois, o homem abre a mão, uma laranja 
surge,esvoaça.As cidades(como em todos os livros que li) 
ardem.Incêndios que destroem o último coração do sonho.Mas 
aquele que se veste com a pele porosa da sua própria 
escrita olha,absorto,a laranja.A queda da laranja 
provocará o poema?A laranja voadora é ,ou não é,uma 
laranja imaginada por um louco?E um louco,saberá o 
que é uma laranja?E se a laranja cair?E o poema? 
E o poema com uma laranja a cair?E o poema em 
forma de laranja?E se eu comer a laranja,estarei a 
devorar o poema?A ficar louco?(...)E a palavra 
laranja existirá sem a laranja?E a laranja voará sem 
a palavra laranja?E se a laranja se iluminar a 
partir do seu centro, do seu gomo mais secreto,e alguém 
a (esquecer) no meio da noite-servirá(o brilho)da 
laranja para iluminar as cidades há muito mortas?E se 
a laranja se deslocar no espaço-mais depressa que o 
pensamento, e muito mais devagar que a laranja escrita-criará 
uma ordem ou um caos?O homem que possui uma 
cabeça de vidro habita o lado de fora das muralhas da 
cidade.Foi escorraçado.(E)na desolação das terras,noite 
dentro,vigia os seus próprios sonhos e pesadelos.Os seus 
próprios gestos-e um rosto suspenso na 
solidão.Onde mora o homem que ousou escrever com a unha na sua 
alma,no seu sexo,no seu coração?E se escreveu laranja 
na alma,a alma ficará saborosa?E se escreveu 
laranja no coração,a paixão impedi-lo-á de morrer?E 
se escreveu laranja no sexo, o desejo 
aumentará?Onde está a vida do homem que escreve, a vida da 
laranja,a vida do poema-a Vida,sem mais nada-estará 
aqui?Fora das muralhas da cidade?No interior do meu 
corpo? ou muito longe de mim-onde sei que possuo uma 
outra razão...e me suicido na tentativa de me 
transformar em poema e poder,enfim,circular 

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